quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

O Cúmulo do Chique

Vivi e com muito orgulho numa bela localidade em Lisboa... entre os Anjos e Arroios durante 5 anos. Consegui fazer a proeza de mudar de casa 3 vezes dentro desta mesma zona! O mais incrível não é isso, é ter sobrevivido a um sub-mundo estranho durante tantos anos e não ter sido assaltada!

Aquela zona é uma espécie de Gomorra da civilização, a maçã podre da cidade, mas um sub-mundo verdadeiramente pitoresco. É uma zona bipolar que oscila entre o pacato de manhã... e uma agitação cheia de gente feia logo que anoitece, gente com ar de Mini- Preço e de lojas dos 300 (as actuais 1,5 euros).

Vê-se coisas raras ( para uma cidade com Lisboa), como velhos a jogarem as cartas e à malha, quase não se vêem crianças por lá... e na minha rua tinha duas casas de alterne “ chiques a valer” uma chamada “ Nórdico” outra chamada “ Big T”. As qualidades dos sítios onde se vive, são directamente proporcionais ás quantidades de supermercados Mini- Preço que existem. É a medida PIB, baseada numa simples cadeia de supermercado... quantos mais há... pior é o bairro.

Pois onde eu vivia, havia três Mini- Preços. Quem lá vai.. não é por ser inteligente ( e não tem nada com o facto de “usar a cabeça”). Mas porque é o supermercado dos excluídos, que se regozijam com o vinho barato e com a lata de atum “ Dia”. Eu ia lá.. as alternativas eram poucas e a vida de estudante.. é basicamente ter pouco dinheiro no bolso e muitas coisas para comprar!

O Nórdico, é um “ bar” com aspecto de bar, a cheirar a mofo durante o dia... e a perfume suburbano à noite! É um bar cheio de homens rebarbados... com o sonho de encontrar uma bela nódica! Mas ok... nada disso! Publicidade enganosa! Nada feito! Não passavam de mulheres estilo tacanhas, descuidadas, com decotes que valha-me deus, calças completamente justas ao corpo disforme, bijuteria rasca cheia de brilho, mal maquilhadas…e com um nome tão português como o meu. Nórdicas? Onde estão?

Ainda havia o Clube Big T (?), que não tinha a nata da sociedade lisboeta, mas nem mais nem menos do que a “nata” da mitralhada velha que por lá andava. A rua era segura graças aos seguranças “ qualquercoisaoves” com ar de poucos amigos, que impunham respeito aos velhos dos BMW de 1982 que tentavam engatar as tugas do clube T.. não com champanhe.. mas com a bela da “MINI”.

(“Queres uma mini, papoila??” seria o mote do engate?)

Tanto num “clube” como noutro, ás vezes via-se o desespero das mulheres casadas, que saíram de casa possuídas à procura dos maridos da classe dos 60 anos! Imploravam ao “qualquercoisaoves” para ir buscar o marido ao bar.... eles não deixavam... e elas faziam-lhe a espera, ao frio, com a camisa de dormir rendada...para lhes dar uma valente coça, e promessas de dormirem na sala durante 3 semanas!

Ainda tinha a “Passerele” clube de mulheres que entre muitas coisas, fazia despedidas de solteira... com um nível duvidoso.. com direito a bandoletes obscenas ás meninas que iam lá fazer a farra. Davam também aulas de streaptease.. que começaram a ganhar adeptos após a Alexandra Lencaste lá ter feito o estágio para se preparar para a série “Ana e os Sete” e se ter preparado para a dança sexy do varão!

Ainda para não bastar, os cafés à tarde, estavam recheados de velhotes que iam para lá a tarde inteira.. e não davam lucro. Levam o pacote de biscoitos na carteira, pediam um chá.. e lá ficavam elas.. a fazer tricot, a cortar na casaca da vizinha, e a disputar o jogo “ quem tem mais doenças” até à hora da telenovela. Quem ganhava tinha direito a um monólogo durante 3 horas sobre a “ dor na espinha”, e coisas do género. Conheci a vencedora... a Dona Deolinda..a diabética que se empanturrava em bolos cheios de creme e com cores totalmente artificiais. Queixava-se que mal andava, mas andava com a bola de Berlim sempre atrás ( “é para a minha neta”… dizia…e eu acredito! Está claro!)

Tinhamos também uma “clínica” para kitar os tunnings... da futura geração frequentadora do Nórdico e do Clube Big T. É uma classe em que o sonho comum, é ter um carro tão cromo como o do “kit”. Contudo os rapazes satisfaziam-se apenas, por enquanto, em por o carro estilo discoteca ( tendo como exemplo supremo, as discos de Vila Franca de Xira) com música de carrinhos de choque e luzes psicadélicas. Desfaziam as cabeça aos velhotes, as meninas dos clubes dançavam quando passavam por eles e sonhavam no dia que os meninos… lhes fizessem uma vénia … com o boné ( isso nunca podia faltar!), e entrassem lá no clube.

O ponto de união da “Gomorra” era na Dona Isabel, uma senhora que geria uma fábrica de bolos na rua e começava ás 11 da noite a sair a primeira fornada deles até as tantas da manhã. Tem os melhores pães de leite de Lisboa… sem dúvida! Mas insistia na falta de higiene e retirava um pão de leite com as mãos sem luvas e com a mesma mão fazia os trocos. Eu já não ligava…. Eram bons e pensei mesmo muitas vezes se esse não era o motivo do mito! Ali confraternizava toda a gente, via-se polícias a serem subornados por bolos ( para não fecharem a pastelaria… que não devia vender bolos ao público à noite) era permitido carros mal estacionados à porta e às portas vizinhas, enquanto os polícias se lambuzavam nos cremes, ali se reuniam as “ nórdicas” ressacadas com tanta mini seguida, estudantes que faziam a paragem sagrada no estudo, enfeitiçados pelos cheiros dos bolos, maridos… que compravam dúzias de bolos para pedir perdão às mulheres…. e também mulheres que enquanto esperavam para dar a coça aos maridos, aqueciam o estômago ( já que não podiam o coração) com os maravilhosos croissants de ovo.

O cheiro a bolos, as personagens, os tunnings, a música de carrinhos de choque… os BMW 1982 e tudo mais.. fazem parte das minhas memórias quase recentes! Fechei o livro…mas as memórias ficaram soltas.

5 comentários:

Raquel Figueiredo disse...

Lisboa , é assim feita de cheiros e de gente diferente.
Para quem não habita nesta zona da cidade fantástica não sabe o que perde.
É ter o bairrismo mas ao mesmo tempo o
desconhecido.
É feita de prédios coloridos e diferentes.
É sossegada e barulhenta.
Está-se perto de tudo.

Maria só tu para descrevres de forma tão artística esta zona fantástica de Lisboa.
*****

Anónimo disse...

Lisboa é que é! Foi preciso falares desta bela localidade, para eu vir comentar no teu blog.
Isso é a zona onde estudei, fiquei nostalgico a ler :) bjs
Daniel

Anónimo disse...

quem é a batata frita e quem é o esparguete??????????????????????????????????????????????????????? tá um pouco confuso o post!!!!

Anónimo disse...

BARIL

Paulo Sampaio Neves disse...

Comprei casa nessa zona da cidade e aí vivo desde Agosto de 2008. Está a ser uma experiência engraçada.

Muito perto do Nórdico e da Disco L.

Subir a Av. Almirante Reis já é perfeitamente normal.

Descer, nomeadamente na zona baixa do Intendente e quando a Almirante Reis passa a Rua da Palma, ainda me causa algumas sensações desagradáveis.

8-)

Está engraçado o post.